Edição: 1 Editora: Biblioteca Azul ISBN: 9788525052247 Ano: 2012 Páginas: 215 Tradutor: Cid Knipel |
Se você está lendo esta resenha, provavelmente é porque temos um interesse em comum: os livros! Pois bem, sejam eles de história ou literatura, de filosofia ou física, talvez seja impossível imaginar sua vida sem eles.
Mas, Bradbury nos dá uma pequena amostra de como poderia ser um mundo onde a leitura é proibida com "Fahrenheit 451". Só é permitido livros técnicos. Tudo aquilo que possa fazer você pensar é perigoso para o sistema. Filosofia? Jamais. Os bombeiros não servem mais para apagar incêndios e sim para iniciá-los, toda casa em que se guardem livros deve arder em chamas e os leitores devem ser presos.
Montag, que trabalha como bombeiro, segue sua rotina de incinerar livros e incendiar casas todo o dia. Mas em meio a uma vida superficial, marcada pela quase onipresença da televisão e ausência de diálogos relevantes ou sinceros, ele se vê cansado e frustrado. Também não encontra conforto algum em casa, onde sua esposa passa todo o tempo de frente para um televisor interativo o qual chama de "família".
As coisas começam a mudar com o aparecimento Clarice, uma jovem excêntrica que se muda para a casa o lado e realmente conversa com Montag. Com um relacionamento íntimo com a natureza e apreciação das coisas simples da vida, Clarice apresenta uma nova realidade possível para Montag.
As conversações dos dois se tornam diárias, até que um dia Clarice some. Montag prossegue com sua vida, mas vai ficando cada vez mais insatisfeito com a realidade posta para ele e com a proibição da leitura. Então, Montag furta alguns livros, enquanto trabalha, com a intenção de matar sua curiosidade.
Mas, suas emoções começam a transparecer e Beatty, o Chefe dos Bombeiros, desconfia do seu comportamento e termina por incendiar a casa de Montag e declará-lo como inimigo, um leitor, corruptor do Estado.
Com a ajuda de Faber, um velho conhecido, Montag agora tenta enfrentar o sistema e fazer as pessoas voltarem a ler.
Analisando de longe, talvez não seja muito perceptível a perspicácia da obra. Bradbury cria um universo em que a ausência de leitura garante a sustentação de um sistema movido à televisão e esportes, as únicas formas de lazer. Daí, se parte para uma série de questionamentos acerca do poder de controle social da televisão somado à ausência de criticidade do telespectador.
Vamos sendo levados a observar os perigos da vivência em uma sociedade apática e inerte, desconectada das sensações humanas, como solidão, tristeza, alegria. As pessoas vivem rodeadas de lazer e diversão, mas sempre de forma esportiva, física ou lúdica, nunca intelectual. A vida aparenta ser prazerosa pela ausência de preocupações, mas é vazia e opaca.
Pela lógica da sociedade em "Fahrenheith 451" quanto menos se pensar, mais feliz se pode ser. Como dizem por aí, "a ignorância é uma benção". Mas Montag sabe que algo não se encaixa, ele não se encaixa.
Segundo Beatty, o Chefe dos Bombeiros, a extinção dos livros começou de maneira natural, os livros foram sendo reduzidos, resumidos, até não fazerem o menor sentido. Mas esta parece ser só uma justificativa, uma tentativa de legitimar um sistema totalitário e proibitivo.
Com algumas possíveis analogias com "Admirável Mundo Novo" e "1984" (resenha aqui), a obra se situa entre as distopias clássicas. Distopias são como metáforas. Há a criação de um mundo diferente, em épocas diferentes e circunstancias improváveis, aliás, tudo sempre parece ser muito improvável. Mas se olharmos com mais atenção podemos enxergar a mesma realidade no presente ou em passado ou futuro muito próximo. Conseguimos perceber certas conexões com nossas realidades atuais.
Ray Bradbury fala sobre queimar livros e ficamos aterrorizados com a mera possibilidade, mas, na verdade, queimamos livros todos os dias. Compramos resumos e manuais, compêndios e livros descomplicados. Quanto menor melhor, quanto mais compacto melhor (e, muitas vezes, mais caro também). Edita-se tudo e nos últimos anos também alteramos tudo para deixar politicamente correto.
Nós somos os bombeiros, quando não queremos ocupar nossas mentes com aquele livro velho de filosofia que fica lá no fundo da estante, somos bombeiros quando preferimos o rápido, o caminho do "fast food". Somos os bombeiros quando trocamos o livro pela novela. E também quando deixamos que os livros sejam dissecados um a um, tendo seus vocábulos alterados para algo de fácil entendimento, porque não queremos mais ler o dicionário.
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Já estava preparando meu comentário comparativo entre sua resenha e minha percepção de 1984, mas, no meio do caminho (o que não foi minha surpresa), você mesma o fez. Ser bombeiro é ser Camarada/Companheiro. Ser bombeiro é utilizar da Novafala.
ResponderExcluirExcelente trabalho!
Olá :)
ExcluirFico muito feliz que tenha gostado!!
Apesar de comparar as duas obras, realmente não tinha pensado na Novafala, mas agora que você falou vejo que faz muito sentido. Obrigada mesmo :D
Tenho MUITA vontade de ler esse livro. Vi partes do filme, e parece brilhante, principalmente o final. Não sei se concordo com o que você fala sobre a relevância maior de livros grandes e clássicos - mas, é claro, preciso ler o livro para ver como o autor constrói essa metáfora. Está na minha lista para este ano. :)
ResponderExcluirAh, não sei se você viu, mas te marquei numa tag: http://blogsemserifa.com/tag-liebster-award
Oi Bárbara :D
ExcluirNão acho que os grandes livros ou clássicos são melhores. O que questionei é essa mania de reduzir tudo e deixar o mais simples possível, de se contentar em ler apenas a manchete do jornal. Sabe?
Se for ler o livro, não deixe de ler o posfácio, que fala justamente sobre isso :D
Quanto a tag, me desculpa!!! Tive que me "ausentar" do blog no último mês :(
Mas ainda dá tempo de fazer, né?
Beijo!